segunda-feira, 12 de outubro de 2009

HISTÓRIA V

Foi sem motivo. Foi por acaso. Ele apenas acordou, escovou os dentes e decidiu falar só a verdade. Pra tudo. Pra todos. Mesmo sabendo que a verdade não é bem aceita por todos. O prazer de dizer verdades era maior que o medo de perder amizades.

sábado, 5 de setembro de 2009

HISTÓRIA IV

O céu amanheceu especialmente claro, sem nuvens, naquele que prometia ser o dia mais importante da sua vida.
Tomou um banho mais demorado que o normal. Vestiu a roupa separada no dia anterior. Evitou seu cachorro para não se sujar. Parou por alguns instantes à porta de sua casa, pensando nas decisões que seria obrigada a tomar.
Deste dia dependia o sucesso de um projeto de anos e anos.
Como um presságio, uma rajada de vento despenteou seus cabelos. Ficou toda descabelada. E, nervosa por causa do projeto, soltou quase rasgando as cordas vocais: vento féla da puta. Essa rajada de vento era um ciclone extratropical que passava impetuosamente por sua rua e o dia ficou tenebroso.
Sentiu algo bater em sua testa. "Granizo?! O que me falta acontecer agora?", gritou, enquanto corria para o bar da esquina. Chegando ao bar, viu uma velhinha atrás do balcão. Ela tomava um conhaque Presidente e esmurrava um velho rádio de pilha. Ouvia-se um ruído do rádio, estado de calamidade, o país estava sendo invadido por tropas estrangeiras.
De repente uma sirene toca, ouve-se gritos fortes vindos da rua e pessoas começam a correr desesperadamente. Atônita, Elisa vê, surgindo na multidão, um enorme elefante cor-de-rosa. "Mas o que é isso?", sussurra incrédula.
Na sela dourada, em cima do elefante, vinha ele. O Homem. Ao vê-lo, Elisa pensou:
"Ó Deus! Não havia mesmo uma hora pior?!"
Parecia que ele tinha engolido uma andorinha: Sarney. Com uma mão segurava no arreio, com a outra, segurava uma mala preta que parecia pesar uma tonelada.
"Confio-lhe os manuscritos de minhas obras literárias", disse ele ao descer do paquiderme.
"Os manuscritos por cima. E por baixo a quantia combinada. Preciso conferir?" perguntou Elisa. O sorriso de Sarney bastava.
Ela abriu a mala, afastou a papelada e começou a contar.
Mil quatrocentos e... mas, espera aí: isso aqui não é Real, isso aqui é Cruzado! O senhor tá achando que eu sou o quê?
-Não é parente?

FIM

terça-feira, 25 de agosto de 2009

HISTÓRIA III

As armas estavam no centro da mesa, cada uma apontada para um lado. Os dois homens se encaravam friamente, tranquilos. Cada um sabia o que tinha que fazer, mas nunca imaginaram que a simples aposta levaria àquele momento decisivo. As mãos do croupier tremiam, ele nem respirava. Um dos dois ases de espada não era parte do baralho. Aqueles homens o assustavam. Aguardavam, dentes trincados. Aquelas cicatrizes tinham histórias que era melhor jamais saber. 
Foi quando o sinal tocou, e a professora apareceu na porta chamando os alunos de volta a sala. Um deles contestou: Pô professora, justo agora que ia começar o tiroteio?


FIM

sexta-feira, 31 de julho de 2009

imprensa

Matéria no jornal Metro!
http://www.readmetro.com/show/en/MetroSaoPaulo/20090815/1/2/

Nota sobre o twiterbook no CCSP (Clube de Criação de São Paulo)!
http://www.ccsp.com.br/ultimas/noticia.php?id=40834

Nota sobre o twiterbook no BlueBus!
http://www.bluebus.com.br/show/2/91708veja_aqui_1_livro_colaborativo_que_esta_sendo_escrito_atraves_do_twitter

Nota sobre o twiterbook no Update or Die!

Nota sobre o twiterbook no Luis Nassif Online!
http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/2009/07/31/o-livro-colaborativo/

Tweet do Walter Longo:
http://twitter.com/walterlongo
@walterlongo Demonstração do valor de uma rede social: @twiterbook. Uma idéia interessante e inteligente para desfrute de pessoas idem.

HISTÓRIA II

Hoje minha mulher morreu. E eu não sei se senti tristeza ou alívio. Descendo a escadaria do prédio, me peguei pensando nas piores coisas que disse à ela. E todas pareciam fazer sentido...
Mas a pior coisa que disse a ela lembro bem. Era domingo, eu estava de preto, ela de branco e eu disse "sim, eu aceito". Na doença e na saúde, até que a morte nos separe. O porteiro me olha estranhamente. Nunca gostei desse sujeito. E com seu tique nervoso de piscar o olho esquerdo, seguiu meus passos até eu cruzar o portão. De longe, ouço: "Assassino!" Era só o que faltava. Aguentar aquela megera 45 anos e ter que ouvir isso. Se quisesse matá-la, teria feito no primeiro dia.
Mas por outro lado pensei: voltar a ser solteiro aos 67 pode ser interessante. No caso, viúvo.

FIM





terça-feira, 28 de julho de 2009

HISTÓRIA I

Capítulo 1

Saiu do quarto correndo e as procurou no armário da sala. "Onde enfiei esta merda?!", gritou consigo mesmo. "Vou perder tudo, tudo!". Olhou entre as páginas dos livros, esvaziou cada gaveta, arremessou tudo no chão e ficou ali, debruçado sobre a desordem.

Foi quando ouviu os passos. Os primeiros que ouvia em semanas. Não havia mais tempo para pensar. Era preciso correr dali. Mas como correr naquele estado? E o pior: para onde correr? Os passos aproximavam-se, seu suor escorria. Não podia deixá-las pra trás, não sabia como ir em frente. Ficou ali, paralisado. Foi quando então, uma súbita carga de adrenalina virou seu corpo e o fez avistar a janela entreaberta.

Foi se aproximando cada vez mais, enquanto ouvia choros e latidos do lado de fora. O medo e a curiosidade também o consumiam. Avistou o velho labrador, vivo: era o sinal. Ao ranger da porta dos fundos, sem escolhas, pulou a janela e correu à floresta. Correu sem olhar pra trás. Os latidos ficaram cada vez mais distantes. Parecia salvo, até se deparar com algo inesperado. Uma cena que nunca vira, mas ouvira falar como sendo lenda, no entando, estava ali, concretizada em suas pupilas.

"Mas ô Felipa? O que você está fazendo aqui abaixada? E quem é esse desmaiado?"

Felipa ergueu a cabeça. Suas lágrimas borravam a maquiagem, feita especialmente para aquela noite. "É culpa sua!", gritava.

"Culpa minha?", sussurrou Tales, levando o dedo aos lábios para que Felipa falasse baixo.

"Sim, culpa sua" repetiu Felipa, sussurando. "Você está uma hora atrasado. Fiquei com medo que estivesse morto".

"Mas você ainda não me disse o que faz aqui e quem é esse sujeito aí no chão. Ele está respirando? O que aconteceu com ele?"

Felipa não queria assumir para Tales que era casada. E muito menos o que havia feito com Bernardo, caído ali no chão. Ela abaixou, enfiou seus dedos no bolso da lapela de Bernardo retirando um papel velho e dobrado. "Você precisa ver isso."

"Maldito! Como ele roubou isso de mim? Veja, é o primeiro esboço de Bosch para a tela 'O Jardim das Delícias Terrenas'".

Tales estava paralisado. Finalmente reencontrara os esboços de Bosch. “Vamos Tales, Bernardo está acordando!” gritou Felipa. 

Tales estava num grande dilema entre saber a verdade ou continuar na dúvida do que estava acontecendo. Relacionou o esboço roubado aos crimes cometidos. "Luxúria... Mais uma vez, a vida imitando a arte", refletiu atordoado.

"Vamos!", Felipa lhe interrompeu o raciocínio; e saíram correndo. Bernardo acordou confuso e logo pôs a mão no bolso.

Capítulo 2

Bernardo voltava para seu ateliê, quando seu celular vibrou. Ficou tenso. Tirou-o de seu bolso e leu a mensagem de Felipa:

"Ele mordeu a isca! Encontre-me no porão. Não esqueça da pizza!"

Não muito longe, no meio da floresta, alguém observava Bernardo com o celular na mão. Já se suspeitava de alguma traição. Bernardo desceu até o porão, acendeu a luz central e sentou-se ansioso mirando a porta. Estava quase na hora. Apareceu alguém no porão, mas não era Felipa e nem Tales. Era a pessoa que Bernardo menos esperava. Ficou sem reação.

"O que você faz aqui Inocêncio" perguntou Bernardo, assustado ao ver o seminarista e seu labrador entrarem pela porta.

"Há muito tempo venho te observando, Bernardo. Sei do que é capaz, por isso vim até aqui lhe fazer uma proposta"

Um silêncio assustador tomou a sala. Bernardo, suando frio, olhava atentamente para os olhos tenebrosos do seminarista. Bernardo percebeu que o seminarista sabia de tudo. Não queria admitir, mas chegara a hora de tomar uma atitude.

"A luxúria retratada por Bosch te parece familiar?", disse Inocêncio, em tom ameaçador. Bernardo tremia, quando avistou um espelho, e a imagem refletida era de Felipa escondida entre as caixas jogadas no porão. Felipa chegara antes de Bernardo no porão. Seria cúmplice de Inocêncio? Bernardo já não sabia se era caça ou caçador...

Notou que Felipa o fitava através do espelho e começara a fazer alguns sinais, os quais Bernardo não compreendia. Ele ainda confuso e sem compreender o que estava acontecendo, levantou e caminhou em direção a Felipa.

Mas antes que pudesse dar o segundo passo, Inocencio solta o labrador, Argus, que deixa Bernardo congelado de medo. Argus correu e pulou em Bernardo, que caiu pra trás num sopetão, com os olhos fechados para não ver o estrago.

"É inútil tentar fugir!" disse Inocêncio a Bernardo.

Bernardo, ainda sem saber o que está a acontecer, olha por todos os lados do porão: As saídas estão realmente bloqueadas. O Labrador fica encarando Bernardo, esperando um comando de Inocencio para terminar o serviço. Inocencio se aproxima. Instintivamente, Felipa reage. Saca de sua bolsa uma arma que pegara de seu pai. Trêmula, aponta para Inocêncio e diz:

"Manda esse pulguento sair de cima dele, seu padreco safado." Inocencio sorri com ironia, e diz:

"Atira eu não tenho mais nada a perder". Felipa engatilha o revólver e atira no labrador. O Labrador se assusta com o tiro, que não lhe acerta. Ele corre e derruba Inocêncio, criando uma saída para Bernardo.

Felipa se descontrola e chora desesperadamente, atirando a arma para longe. Enquanto isso Bernardo... se aproxima de Felipa. Inocencio pega a arma no chão e, apontando para Bernardo, diz: "Ela não tem nada a ver com isso." Bernardo aponta para a escada e Felipa sai antes mesmo de Inocêncio fazer a proposta.


Capítulo 3

Três meses antes, Tales entra cauteloso na padaria e pede 5 baguetes. "Então é você?" pergunta a mulher ao seu lado.

"Felipa?"

Tales contempla o cartão que a atraente jovem acabara de lhe entregar .

"Então, o que você quer de mim?"

Felipa não esconde a sua impaciência:

"Leia o cartão que saberá o que eu quero de você, Tales."

"Exposição das obras de Bernardo Albertini? Ah, sinto muito, Felipa. Não freqüento mais estes lugares".

"Por que não?! E se eu lhe desse um bom motivo para voltar a frequentá-los? Ou uma excelente recompensa..." insiste Felipa.

O olhar de Felipa era frio e instigante. Uma mistura de sedução e medo percorriam o corpo de Tales, quando de repente Felipa o puxou para fora da padaria e o beijou ardorosamente. Tales estava num perigoso jogo, mas não podia mais resistir.

Tales fica completamente anestesiado depois do beijo. Felipa coloca no bolso de Tales um celular e faz uma pergunta.

"Sabe guardar segredo? Não anote esse número. Guarde só na memória. Depois lhe explico tudo." E colou os lábios em sua orelha.

Duas horas depois, Tales queria mais. Não podia confiar, mas queria. Teclou então o número e um homem atendeu. Uma voz rouca, parecia falar de um lugar fechado.

"Não ligue durante o dia!" Foi tudo que disse, e desligou em seguida.

"O que Felipa estava armando?", pensava Tales. A curiosidade consumiu Tales naquele dia.As horas foram passando, o sol se pondo e uma mistura de ansiedade, medo e desejo tomando conta, quando toca o telefone.

"Estarei às 21h na exposição do Bernardo. Me encontre no átrio esquerdo. Fiquei perto da saída. Finja não conhecer Felipa"

Era a voz de Inocêncio. Tales já estava farto de tanto mistério e resolve sair de cena. O vôo para Paris foi agradável.


Último Capítulo

"Quem era pior traidor,Tales ou Felipa?", refletiu Bernardo.No ateliê, pintava um novo quadro boschiano sobre a luxúria.

Enquanto isso, chegando no ateliê de seu marido, Felipa planejava sua vingança "Preciso dar um fim a essa história", pensou

Felipa fitou todos os quadros e pensou no que poderia fazer; então lembrou-se de "O Jardim das Delícias Terrenas" e sorriu. Tranquilamente, tirou o revólver de sua bolsa e apontou para as costas de Bernardo. "Meu amor", sussurou diabolicamente. Bernardo virou-se assustado. A feição incomum de sua esposa o fez estremecer. "Solte essa arma, pelo amor de Deus Felipa"!

"Você nunca acreditou em Deus, nem em amor, seu traidor. Nosso Jardim do Éden chegou ao fim", disse Felipa.

"A maior traição não foi a minha, e você sabe dis..." Antes de Bernardo terminar a frase, Felipa, agora chorando, atirou.

Bernardo, desacreditado, desmoronou no chão. As tintas em suas mãos se confundiam com o sangue escorrendo de sua barriga. Felipa chorava, mas sentia-se satisfeita. Tinha a impressão de que havia vencido o amor que sentia pelos seus dois homens. Seu marido parecia ter desmaiado. O cobriu até o pescoço com um lençol, e começou a retocar sua maquiagem borrada.


Na velha casa de madeira, Tales despertava de um sono profundo. Sentia-se muito fraco e sujo... Levantou-se com dificuldade e lembrou-se vagarosamente do motivo dele estar ali, quase morto. "Traidores filhos da puta", pensou.

Mas nada mais importava. Em meio a tanto pecado, luxúria e traição, a única coisa que lhe restava era encontrá-las.

"Preciso de pelo menos uma", pensou Tales, aflito. Saiu do quarto correndo e as procurou no armário da sala...

FIM